O "milagre econômico
brasileiro" é a denominação dada à época de excepcional crescimento
econômico ocorrido durante o Regime militar no Brasil, também conhecido pelos
oposicionistas como "anos de chumbo", especialmente entre 1969 e
1973, no governo Médici. Nesse período áureo do desenvolvimento brasileiro em
que, paradoxalmente, houve aumento da concentração de renda e da pobreza,
instaurou-se um pensamento ufanista de "Brasil potência", que se
evidencia com a conquista da terceira Copa do Mundo em 1970 no México, e a
criação do mote: "Brasil, ame-o ou deixe-o". Sendo a alta nas bolsas
de valores brasileiras iniciada ao final da década de 1960,1 reflexo deste
clima de euforia generalizada, que o autor Elio Gaspari apelidou de "patriotada",
que tinha como "trilha sonora" a canção Pra frente Brasil. Segundo
Reinaldo Gonçalves, professor da UERJ e economista, o período do milagre
econômico foi o que trouxe maior crescimento econômico desde a Proclamação da
República. Foi um período paradoxal da História do Brasil. Ainda diz Elio
Gaspari em sua obra A Ditadura Escancarada :
“O Milagre Brasileiro e os Anos de
Chumbo foram simultâneos. Ambos reais, coexistiam negando-se. Passados mais de
trinta anos, continuam negando-se. Quem acha que houve um, não acredita (ou não
gosta de admitir) que houve o outro. ”
1 Como se iniciou
2 O papel das estatais nesse processo
3 "Obras Faraônicas"
3.1 Programa nuclear brasileiro
3.2 Usina Hidrelétrica de Itaipu
3.3 Integração econômica da Região
Norte
4 Concentração de renda
5 Crash de 1971
6 O fim do milagre
1.
Como se iniciou
Após o governo de Juscelino
Kubitschek, entre 1956 e 1961, no qual o Brasil passou por acelerado
crescimento econômico graças ao Plano de Metas - o programa "cinquenta
anos em cinco" - que era baseado na política de substituição de
importações sob a inspiração da CEPAL, e com a construção de Brasília, surgiu
uma forte pressão inflacionária no País, já sentida no final do governo JK e
que se agravou com a renúncia de Jânio Quadros e com os impasses institucionais
que marcaram o período de João Goulart (1961-1964). Tais fatos fizeram com que
se elevassem os défices do governo de tal forma que se formou uma forte
inflação de demanda.
Logo após o Golpe Militar que se
seguiu em abril de 1964, no início do governo Castelo Branco, foi criado um
primeiro Programa de Ação Econômica do Governo - PAEG4 , com dois objetivos
básicos: formular políticas conjunturais de combate à inflação, associadas a
reformas estruturais, que permitiram o equacionamento dos problemas
inflacionários causados pela política de substituição de importações e das
dificuldades que se colocavam ao crescimento econômico; o que requeria, agora,
que fosse dado um segundo passo no processo: a expansão da então pequena indústria
de base (siderurgia, energia, petroquímica) para evitar que o aumento da
produção de bens industriais de consumo final, ampliada pela política de
substituição de importações, provocasse um aumento insustentável nas
importações brasileiras de insumos básicos, que a indústria nascente consumia
de forma crescente.
Após um período inicial recessivo, de
ajuste, que foi de março de 1964 até fins de 1967 - com a reorganização do
sistema financeiro do Brasil, a recuperação da capacidade fiscal do Estado e
com uma maior estabilidade monetária - iniciou-se em 1968 um período de forte
expansão econômica no Brasil.
De 1968 a 1973 o PIB brasileiro
cresceu a uma taxa média acima de 10% ao ano, a inflação oscilou entre 15% e
20% ao ano e a construção civil cresceu, em média, 15% ao ano. Durante essa
fase, o grande arquiteto e executor das políticas econômicas no Brasil foi
Antônio Delfim Netto, que chegou a ser chamado de "super-ministro".
Em análises posteriores justifica-se
esse grande crescimento afirmando que os mercados em que os investimentos se
concentraram eram todos (usando a expressão inglesa) Green Field Market, ou
seja, novas áreas para se investir[carece de fontes]. O mesmo ocorre nos dias
atuais na República Popular da China. Mais do que uma consequência de política
econômica bem planejada (apesar de muitas vezes pouco ética), o crescimento
chinês é fruto do fato de muitos novos setores estarem se abrindo,
possibilitando um rápido e vertiginoso aumento da atividade econômica.
2.
O papel das estatais nesse processo
Delfim
Netto.
Em 1967, assume o comando da economia
Antônio Delfim Netto e seu interino José Flávio Pécora. Para Delfim, o PAEG
teria provocado uma queda da demanda indesejada, causando recessão e redução do
nível de empregos. Segundo Delfim, o desenvolvimento interno do mercado
brasileiro poderia por si só gerar crescimento.[carece de fontes] Nesse
contexto de recessão, o governo adotou medidas de inspiração keynesiana,[carece
de fontes] aumentado o investimento nas empresas estatais, agora recapitalizadas
graças à política da chamada verdade tarifária (isto é, fixação das tarifas sem
influências políticas), que as tornavam lucrativas e competitivas - conceito
esse que foi amplamente defendido pelos economistas e intelectuais brasileiros
da época.
O Estado investiu muito na indústria
pesada, siderurgia, petroquímica, construção naval e geração de energia
hidrelétrica. O sucesso dessa política econômica logo se tornou evidente: o
crescimento da produção de bens duráveis de consumo no Brasil daquele período
alcançou a taxa média de 23,6% ao ano, e o de bens de capital 18,1%. As
empresas estatais cresceram e, bem administradas, obtiveram lucros imensos.
3.
"Obras Faraônicas"
Durante o Milagre econômico, com
intuito de romper a estagnação gerada pelo governo pós Juscelino Kubitschek e
incentivar a integração nacional e o crescimento econômico, o governo militar
impôs vários programas nas áreas de transportes, de energia e de estratégia
militar.5 . A imprensa na época, que com a atuação da censura vigente, não
podia criticar diretamente o governo e chamou tais obras de
"faraônicas"6 , aludindo a infraestruturas enormes e de pouca
importância útil. Porém, ao longo dos anos, a maioria das obras, como Itaipu e
a Ponte Rio-Niterói provaram-se importantes e necessárias. Mesmo com Itaipu o
Brasil já sofreu com crises energéticas e a Ponte Rio-Niterói hoje se encontra
em estado de saturamento máximo durante várias horas ao dia.
4.
Programa nuclear brasileiro
m 1972, é iniciada a construção de
Angra 1 através da aquisição de um reator nuclear francês. Para os militares da
época, o domínio da tecnologia nuclear era indispensável para soberania
nacional, sendo que a construção da usina era o início para a obtenção de armas
de destruição em massa secretamente.7
5.
Usina Hidrelétrica de Itaipu
Por meio de negociações com o Paraguai
no início da década de 1970 que pretendia melhorar os laços de cooperação entre
os dois países e o aumento da capacidade de geração de eletricidade do país, a
usina hidrelétrica é iniciada em 1975 e finalizada em 1982, sendo a maior usina
hidrelétrica do país até a atualidade.8
6.
Integração econômica da Região Norte
Rodovia
Transamazônica, Projeto Radambrasil e Zona Franca de Manaus
Visando a integração da Região Norte
do Brasil com o resto do país, o governo tomou uma série de medidas que
permitiriam sua ocupação e desenvolvimento.9 Para isso, o antigo Projeto Radam
fora retomado - cujo objetivo seria mapear e monitorar a vasta região amazônica
- e uma zona especial de incentivo fiscal foi criada em Manaus (Zona Franca de
Manaus), para romper com a estagnação econômica da cidade vivenciada na época.
Também construiu-se uma extensa rodovia não-pavimentada, que partia do Nordeste
e cruzava a maior parte da Amazônia Legal. A estrada hoje se resume a trechos
isolados de terra, sendo que as dificuldades em se mantê-la em um ambiente
equatorial e devido a maior praticidade do transporte hidroviário na área
também colaboraram para tal.
7.
Concentração de renda
Apesar do equilíbrio obtido nas contas
externas, a dívida nacional cresceu exponencialmente nesse período, o que se
tornou possível pelo elevado grau de liquidez internacional que então
prevalecia. Os países produtores de petróleo, com a elevação ocorrida em seu
preço a partir de 1971 e, sobretudo, após a crise do petróleo em 1974,
dispunham de grande liquidez e estavam acumulando bilhões de dólares em seus
caixas, que ofereciam, sob forma de empréstimos a juros relativamente baixos,
aos países importadores de petróleo, seus clientes. O Brasil se utilizou
amplamente desses financiamentos para consolidar seu crescimento e para
aumentar suas reservas internacionais.
Esse forte crescimento econômico do
Brasil, contribuiu, de forma paradoxal, para agravar ainda mais sua
desigualdade socioeconômica.
Como o Brasil necessitava - para
crescer - de aumentar sua poupança interna, prevaleceu um conceito segundo o
qual não se deveria adotar políticas econômicas de distribuição de renda já que
as classes de renda mais elevada poupavam mais que as de baixa renda. Assim,
segundo essa teoria, se a renda nacional fosse dirigida aos mais pobres, a
poupança interna cairia (baseado no princípio econômico de que a propensão para
consumir é maior nas classes de renda mais baixa).
Ficaram famosas as explicações dadas
por Delfim na televisão, em que defendia: "É preciso primeiro aumentar o
'bolo' (da renda nacional), para depois reparti-lo".11
Com isso adotou-se uma política
salarial que os sindicatos apelidaram de "arrocho salarial" (ver:
Salário no Brasil). O salário mínimo real, apesar de cair menos do que no
período entre 1964 e 1966, quando sofreu uma diminuição de 25%, baixou mais 15%
entre 1967 e 1973.
Dessa forma, as vantagens do
crescimento econômico não foram igualmente distribuídas pelas diversas camadas
da população e ficaram concentradas, principalmente, nos capitalistas e nas
classes sociais de renda mais alta. O salário mínimo continuou a ser achatado;
graças à situação de "pleno emprego", que havia no período, os
operários mais especializados conseguiram, na sua maioria, "descolar"
seus salários do salário mínimo oficial e foram, assim, parcialmente
beneficiados pelo crescimento econômico ocorrido.
A correção monetária das poupanças
protegia, contra os efeitos da inflação, a classe média e média alta - que
tinham contas bancárias - mas proteção não havia para as classes muito pobres,
que viam seu dinheiro desvalorizar dia a dia nos seus bolsos. Isso provocava
uma transferência de renda das classes mais baixas para as mais altas,
contribuindo para uma maior concentração de renda.
Os dados de 1970 mostram que os 5%
mais ricos da população aumentaram sua participação na renda nacional em 9% (em
relação a 1960) e detinham 36,3% da renda nacional. Já a faixa dos 80% mais
pobres diminuíra sua participação em 8,7% no período, e ficara com 36,8% da
renda.
Apesar do rápido crescimento econômico
e da condição de pleno emprego que isso provocou, houve um "empobrecimento
dos mais pobres": eles simplesmente não aumentaram sua renda, que era
corroída em valor real pela inflação.
O crescimento econômico foi vigoroso:
o consumo de energia elétrica crescia 10% ao ano13 , as montadoras de veículos
produziram, em 1970, 307 mil carros de passeio, o triplo de 196414 Os
trabalhadores tinham em casa 4,58 milhões de televisores, contra 1,66 milhão em
1964.15 .
Viveu-se um ciclo inédito de
desenvolvimento no Brasil; o governo divulgava estes números na sua publicidade
pela TV, e eles constituíam a viga mestra da política de sustentação
publicitária do governo militar; criavam-se motes de "Brasil
Potência", "Brasil Grande" e o mais famoso deles, "Brasil,
ame-o ou deixe-o" ("slogan político" amplamente divulgado, sob o
patrocínio do Centro de Informações do Exército (CIE), que distribuía
gratuitamente os adesivos nas cores verde-amarela, para serem exibidos, com
orgulho, nos pára-choques de muitos carros particulares. Os opositores ao
regime viam nesse mote mais uma "patriotada").
Segundo dados divulgados pelo
IPEAData, o coeficiente de Gini brasileiro era de 50,0 em 1960, tendo piorado
para 57,0 em 1970 e para 62,0 em 1977, oscilando em torno desses números até
hoje (2008), quando atingiu 52,0, o que revela uma lenta melhora, não tendo
retomado aos patamares da década de 60.
Essa análise é correta quanto aos
fatos mas é uma análise simplista dos acontecimentos no seu todo. Só comparar
os coeficientes de Gini do início e do fim da fase de rápido crescimento
econômico no Brasil distorce a compreensão do que realmente ocorreu nesse
período. Embora tenha se tornado frequente repetir "ad nauseam" que
"durante o milagre brasileiro não houve distribuição de renda", é
preciso tentarmos entender como e por que esses índices não mudaram.
Ocorreu, durante todo o período do
"Milagre Brasileiro", um dos maiores fluxos migratórios da história
do país, com os trabalhadores rurais - que trabalhavam num regime arcaico e
ineficiente, de baixa produtividade - sendo praticamente "expulsos"
das propriedades rurais, onde viviam há gerações, em virtude da promulgação do
Estatuto do Trabalhador Rural de 1963, alterado em 1973.
Parte dessa imensa massa migratória
foi absorvida pela indústria, sobretudo, mas não só de construção civil, mas
também pelas indústrias pesadas que não exigiam escolaridade, e até mesmo pelo
comércio. Mas parte considerável desse enorme contingente migratório habitou as
favelas no entorno das grandes cidades, onde sua situação econômica, que já era
precária, piorou ainda mais em relação à baixa escolaridade média e à estrutura
ineficiente (quando não total ausência) dos serviços públicos. Se viviam com
renda quase nula nas fazendas, agora convivem nas favelas com a pouca renda e
com uma série de novos encargos monetários a arcar, aos quais não estavam
habituados: têm que pagar pelo aluguel, água, luz, gás, transporte coletivo,
etc.
“O trabalho regular, "com
carteira assinada", chegou a cobrir mais de 2/3 da população de São Paulo.
O subemprego - os que trabalham nas ocupações de menor produtividade - sofreu
queda marcante ao longo daqueles anos de crescimento. A mera transferência de
contingentes expressivos de mão-de-obra ocupada na agricultura para empregos na
indústria, na construção civil e nos serviços funcionais teve impacto
significativo no grau de pobreza.”
Cabe a nós nos indagarmos o que teria
acontecido com o coeficiente de Gini no Brasil se a migração para as cidades
não tivesse coincidido com um período de forte expansão da economia, em que
pelo menos uma parte dos migrantes, expulsos do campo, encontrou emprego formal
nas cidades.
Houve uma única tentativa do governo
militar no sentido de cuidar do problema de distribuição de renda que, além de
se revelar insuficiente atendia apenas à zona rural: em 1971 foi criado, pela
Lei Complementar nº 11 de 25 de maio de 1971, durante o governo Médici, o
Prorural, que concedia meio salário mínimo mensal a todo lavrador ou pequeno
proprietário que completasse 65 anos.
O "milagre econômico"
evidenciou a má distribuição de renda, conforme afirmado em O MILAGRE ECONÔMICO
BRASILEIRO de 30 de agosto de 2003, escrito por Carlos Frederico Pereira da
Silva Gama:
“Em 1979, apenas 4% da população
economicamente ativa do Rio de Janeiro e São Paulo ganha acima de dez salários
mínimos. A maioria, 40%, recebe até três salários mínimos. Além disso, o valor
real do salário mínimo cai drasticamente. Em 1959, um trabalhador que ganhasse
salário mínimo precisava trabalhar 65 horas para comprar os alimentos
necessários à sua família. No final da década de 70 o número de horas
necessárias passa para 153. No campo, a maior parte dos trabalhadores não
recebe sequer o salário mínimo. ”
Este fenômeno de concentração de renda
é uma consequência direta do próprio desenvolvimento econômico.
Para evitar que distorções
indesejáveis na distribuição de renda tivessem ocorrido o governo precisaria
ter adotado, políticas econômicas específicas para corrigir a concentração de
renda[carece de fontes] (o que não fez)[carece de fontes], sem as quais ela
aumenta, naturalmente[carece de fontes], ainda mais[carece de fontes], durante
os períodos de crescimento.
A concentração de renda no Brasil
permaneceu praticamente inalterada - seus índices oscilando dentre as piores
posições do mundo - durante as últimas quatro décadas.[carece de fontes] Uma
análise desse problema, que perdura até os tempos atuais, se encontra no artigo
sobre distribuição de renda.
8.
Crash de 1971
O crash que se iniciou em junho de
1971, foi o "estouro" da segunda maior bolha especulativa da história
brasileira em termos relativos, referente ao numero de participantes do
processo, em relação à população total, e diversidade de classes sociais, às
quais pertenciam. Embora, nem de longe tenha causado os efeitos políticos,
econômicos e sociais devastadores de seu antecessor, ocorrido 80 anos antes.
A alta ocorrida nas bolsas de valores
brasileiras, notadamente as do Rio e a de São Paulo, durante o final da década
de 1960, estava dentro do panorama de euforia econômica do período, não sendo
portanto um fenômeno isolado. Ao final do ano de 1970 não havia indícios do
estouro da bolha que ocorreria meses mais tarde. Mesmo ocorrendo altas de até
400% registradas em algumas ações nas Bolsas, a euforia geral induzia a se
acreditar que tais valorizações refletiriam à real situação e potencial das
empresas. Poucos perceberam à época a iminência do crash que ocorreria.
Não houve um dia específico de queda.
As condições presentes nos mercados de capitais no Brasil na época ajudaram a
impulsionar a queda de liquidez que este então sofreu. Queda esta que
prosseguiu até 1973, e cujos efeitos psicológicos se fariam sentir por muitos
anos, para a grande massa que então começava a participar ativamente no mercado
de capitais e que, a exemplo da geração do encilhamento, foi pega na queda,
tanto por não se encontrar preparada do ponto de vista educacional-financeiro,
para atuar nos mercados, quanto pelo próprio mercado não estar preparado para
recebê-la, já que não dispunha à época (para esta massa de pequenos
investidores e especuladores), de quaisquer mecanismo de atuação em relação a
um crash.
Do sentimento de desconfiança que se
gerou após sua ocorrência, agravado pelas crises do petróleo na década de 1970,
e da dívida externa no início da década seguinte, o mercado brasileiro só iria
se recuperar paulatinamente nos anos '80.
9.
O fim do milagre
Após a prolongada queda do Crash de
1971, a partir de 1973 o crescimento da economia brasileira diminuiu e em 1974
ocorreu o primeiro choque do petróleo, quando seu preço foi elevado
abruptamente de US$3,37 para US$11,25 por barril. A crise do petróleo provocou
uma aceleração da taxa de inflação no mundo todo e principalmente no Brasil,
onde passou de 15,5% em 1973 para 34,5% em 1974. O crescimento diminuiu no
período 1974-1979 passando a 6,5% em média; na época do "milagre" as
taxas de crescimento eram, em média, superiores a 10% anuais, tendo alcançado
picos de 13% anuais.
A balança comercial brasileira, a
partir de 1974, apresentou enormes défices causados principalmente pela
importação de petróleo, que ultrapassaram os 4 bilhões de dólares ao ano. A
capacidade de geração de divisas tornou-se insuficiente para sustentar o ritmo
do crescimento. No final dessa década, a inflação chegou a 94,7% ao ano; em
1980 já era de aproximadamente 110 %, e em 1983 alcançou o patamar de 200%.
A chegada de Jimmy Carter à Casa
Branca em 1977 também dificultou a sustentabilidade político-econômica da
ditadura militar brasileira, visto que Carter foi o primeiro presidente desde o
assassinato de John Kennedy em 1963 que não deu pleno apoio norte-americano a
regimes anticomunistas autoritários na América Latina.
A dívida externa brasileira chegou a
US$ 90 bilhões. Para pagá-la, eram usados 90% da receita oriunda das
exportações, e o Brasil assim entrou numa fortíssima recessão econômica que
duraria até a década de 1990 e que tem como maior fruto o desemprego, que se
agravou com o passar dos anos.
10.
O regime militar de 1964
As causas e condições do golpe militar
de 1964 foram os seguintes: a radicalização da “política de massas” promovida
pelo populismo de esquerda e a mobilização popular que a acompanhava; a reação
conservadora das elites e das Forças Armadas contra o governo de João Goulart;
a redução do crescimento econômico e o descontrole da inflação; a pressão
externa dos Estados Unidos a favor da conspiração em nome da “segurança” do
hemisfério ocidental no contexto da guerra fria.
O general Humberto Castelo Branco foi
o primeiro presidente do regime militar de 1964. Durante seu governo
(1964-1967) começou a enxurrada de decretos, leis, Atos Institucionais e
Emendas Constitucionais:
Ato Institucional n° 1 (10/04/64) –
autorizava a cassação de mandatos e a suspensão de direitos políticos de
parlamentares, governadores, funcionários públicos e líderes sindicais, além
dos ex-presidentes Jânio Quadros, João Goulart e Juscelino Kubitschek.
Determinou também a eleição indireta para a Presidência da República.
Ato Institucional n° 2 (27/10/65) –
dissolveu os partidos políticos existentes e criou o bipartidarismo. Surgiu, um
partido do governo – a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) – e outro de
oposição, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
Lei de Imprensa (9/2/67) – impôs
restrições à liberdade dos meios de comunicação, sobretudo aos jornais e
revistas, prevendo ainda o direito a censura prévia a livros, revistas e
espetáculos.
No plano econômico, o governo Castelo
Branco anunciou um programa econômico denominado PAEG (Plano de Ação Econômica
do Governo), a fim de combater a inflação, estimular as exportações e
desestimular as importações. O Paeg alcançou vários objetivos com a redução da
inflação e a recuperação das exportações agrícolas.
11.
Resistência e Repressão
Em março de 1967, tomou posse o
segundo presidente militar, o general Artur da Costa e Silva (1967-1969).
Durante o seu governo, cresceu no país a reação ao regime militar, mobilizando
diversos setores sociais e políticos no Brasil.
Formou-se ainda em 1966 a Frente
Ampla, com Carlos Lacerda, ex-governador do estado da Guanabara (hoje Rio de
Janeiro), que se aliou com os ex-presidentes João Goulart e Juscelino
Kubitschek e parte do MDB, que almejavam preparar um bloco de resistência
liberal-democrático. Contudo, a Frente Ampla não conseguiu a trair o apoio da
população e acabou se extinguindo.
Na verdade, a mobilização popular de
expressão contra o regime seria o movimento estudantil. Liderados por
dirigentes da União Nacional dos Estudantes (UNE), que atuava na
clandestinidade, os estudantes promoviam manifestações e comícios em todas as
grandes cidades do país.
12.
Manifestação contra a Ditadura no Rio de Janeiro, em junho de 1968.
No dia 27 de Outubro de 1964, o
Congresso Nacional já havia extinguido a UNE e todas as uniões de estudantes
estaduais, aprovando a Lei Suplicy.
O auge dos protestos estudantis se
deram a partir da morte do estudante paraense Edson Luís de Lima Souto
assassinado pela Polícia Militar em 28 de março de 1968 durante um confronto no
restaurante Calabouço, centro do Rio de Janeiro. Edson foi o primeiro estudante
assassinado pela Ditadura Militar e sua morte marcou o início de um ano
turbulento de intensas mobilizações contra o regime militar.
Centenas de cartazes foram colados na
Cinelândia com frases como "Bala mata fome?", "Os velhos no
poder, os jovens no caixão" e "Mataram um estudante. E se fosse seu
filho?".
Em 26 de junho ocorre a Passeata dos
Cem Mil, uma manifestação de protesto, em consequência da morte do estudante
secundarista Edson Luís. A manifestação reuniu mais de cem mil pessoas, no
centro da cidade do Rio de Janeiro, na zona conhecida como Cinelândia, o que
representou um dos mais significativos protestos no período ditatorial do Brasil.
A música popular também foi utilizada
para propagar a resistencia contra o regime militar. Na década de 60, os
festivais de música popular da TV Record, de São Paulo, serviram como veículo
para expressar a indignação dos artistas contra a opressão imposta pela
ditadura. É dessa época a música “Pra não dizer que não falei de flores”, mais
conhecida como “Caminhando”, de Geraldo Vandré, que se tornou um hino de
contestação e mobilização contra o regime militar, juntamente com o samba
“Apesar de você”, de Chico Buarque de Holanda.
Caminhando tornando-se um hino de
resistência contra o governo militar foi censurada. O Refrão “Vem, vamos embora
/ Que esperar não é saber / Quem sabe faz a hora, / Não espera acontecer” foi
interpretado como uma chamada à luta armada contra os ditadores.
“Apesar de você” é uma canção escrita
e originalmente interpretada por Chico Buarque de Hollanda, em 1970 , no exílio
em Roma. A canção, por implicitamente lidar com a questão da falta de liberdade
durante a época da ditadura militar, foi proibida de ser executada pelas rádios
no Brasil pelo governo Médici.
Hoje
você é quem manda
Falou,
tá falado
Não
tem discussão, não.
A
minha gente hoje anda
Falando
de lado e olhando pro chão.
Viu?Você
que inventou esse Estado
Inventou
de inventar
Toda
escuridão
Você
que inventou o pecado
Esqueceu-se
de inventar o perdão.
(Coro)
Apesar
de você
amanhã
há de ser outro dia.
Eu
pergunto a você onde vai se esconder
Da
enorme euforia?
Como
vai proibir
Quando
o galo insistir em cantar?
(Letra
de “Apesar de você”, de Chico Buarque de Holanda, 1970.)
13.
A Guerrilha Urbana
Setores radicais de esquerda começaram
a atacar o governo com ações clandestinas armadas, como assaltos a bancos,
sequestro de diplomatas e atentados contra autoridades e unidades militares.
Uma das primeiras organizações a
pegarem em armas contra a ditadura foi a Ação Libertadora Nacional (ALN), uma
organização revolucionária comunista brasileira de oposição ao regime militar,
surgida no fim de 1967, com a expulsão de Carlos Marighella do Partido
Comunista do Brasil (ex-PCB). A ALN tinha a proposta de uma ação objetiva e
imediata contra a ditadura militar, defendendo a luta armada e a guerrilha como
instrumento de ação política.
Além da ALN, houve na guerrilha
urbana, a VAR-Palmares e o MR-8. A Vanguarda Armada Revolucionária Palmares
(VAR-Palmares) foi uma organização brasileira de esquerda que combateu o regime
militar. Surgiu em julho de 1969, como resultado da fusão do Comando de
Libertação Nacional (Colina) com a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) de
Carlos Lamarca.
14.
Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8) foi uma organização brasileira
de esquerda, com orientação marxista-leninista, que participou do combate
armado à Ditadura no Brasil. Seu nome rememora a data em que o guerrilheiro
argentino Che Guevara foi capturado pela CIA na Bolívia.
As
principais ações da guerrilha urbana no Brasil de 1968 a 1970 foram: o assalto
ao trem pagador da ferrovia Santos-Jundiaí (10/6/1968), pela ALN; o ataque ao
QG do II Exército (26/6/1968), pela VPR; o roubo do cofre de Adhemar de Barros
(11/5/1969), contendo pouco mais de 2,8 milhões de dólares, em espécie, o
equivalente a 16,2 milhões de dólares de 2007, pela VAR-Palmares; o assassinato
do capitão do Exército dos Estados Unidos e suposto agente da CIA Charles
Rodney Chandler (12/10/1969), pela VPR; o sequestro do embaixador
norte-americano Charles Burke Elbrick (4/9/1969), pela ALN e o MR-8.
A maioria dos guerrilheiros eram
estudantes, com idade média de 23 anos, que haviam se mobilizados nas ruas em
1968. Boa parte havia abandonado as universidades. De cada dez ações de
guerrilha, oito buscavam dinheiro, armas, papéis de identidade. As ações mais
ofensivas, como os sequestros de diplomatas, destinavam-se a tirar gente da
cadeia ou do país.
A destruição das organizações armadas
começou em 1969, a partir da organização das atividades de policia política
dentro do Exército. No final de 1970, todas as organizações da guerrilha urbana
estavam desestruturadas.
15.
A Guerrilha no campo
No campo, a mobilização guerrilheira
teve sua maior expressão com a Guerrilha do Araguaia. A Guerrilha do Araguaia
foi um conjunto de operações guerrilheiras ocorridas durante a década de 1970.
O movimento foi organizado pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), oriundo de
uma cisão no PCB. Os integrantes do PCdoB pretendiam combater o governo militar
e implementar o comunismo no Brasil, iniciando o movimento pelo campo.
Os guerrilheiros eram em sua maioria
estudantes, professores e profissionais liberais. Os militantes do PcdoB
começaram a chegar na região a partir do final da década de 1960. Oriundos do
sul e sudeste, eram chamados de “paulistas”.
Estima-se que participaram em torno de
setenta a oitenta guerrilheiros sendo que, destes, a maior parte se dirigiu
àquela região em torno de 1970. Entre eles, estavam Osvaldo Orlando Costa (o
“Osvaldão”), o médico João Carlos Haas Sobrinho, a estudante de biologia da
Universidade Federal Fluminense Cristina Moroni de 21 anos, Maria Célia Corrêa,
26 anos, estudante da Faculdade Nacional de Filosofia, além do ex-presidente do
Partido dos Trabalhadores (PT), José Genoíno, que foi detido pelo Exército em
1972.
Os guerrilheiros se estabeleceram em
uma região onde os estados de Goiás, Pará e Maranhão faziam fronteira, às
margens do rio Araguaia-Tocantins, próximo às cidades de São Geraldo e Marabá
no Pará e de Xambioá, no norte de Goiás (região onde atualmente é o norte do
Estado de Tocantins, também denominada como Bico do Papagaio).
16.
O Campo de Batalha guerrilheiro.
Logo, procuraram se integrar às
comunidades locais. Para isso, faziam seus roçados, montavam farmácias e, de
acordo com suas habilidades, ajudavam em partos, faziam cirurgia e dedicavam-se
a alfabetização da população local.
Os guerrilheiros criaram a ULDP (União
pela Liberdade e pelos Direitos do Povo), onde discutiam as reivindicações de
interesse dos moradores locais, sobretudo questões relacionadas à grilagem e
repressão, estimulando a consciência política da população e buscando apoio
para a guerrilha. Também se organizaram militarmente com a formação das FORGAs
(Forças Guerrilheiras do Araguaia), promovendo treinamentos e ações de
guerrilha.
O Exército Brasileiro descobriu a
localização do núcleo guerrilheiro em 1971 e fez três investidas contra os
rebeldes. Os guerrilheiros, surpreendidos, se refugiaram armados na floresta.
As operações de guerrilha iniciaram-se efetivamente em 1972, tendo oferecido
resistência até março de 1974.
Em 1972, no primeiro choque com a
guerrilha, uma tropa do Exército foi desbaratada. Em 5 de maio, outra tropa foi
desbaratada pela guerrilha, um tenente foi ferido e o cabo Odílio Cruz Rosa, da
5ª Companhia de Guardas de Belém foi morto. A guerrilha também atacou uma base
do 2° Batalhão de Infantaria de Selva e matou o sargento Mário Abrahim da
Silva.
Em janeiro de 1975 as operações foram
consideradas oficialmente encerradas com a morte ou detenção da maioria dos
guerrilheiros.
Em 1976 ocorreu a chamada Chacina da
Lapa quando foram executados os últimos dirigentes históricos do PCdoB.
17.
Os anos de chumbo
A repressão da ditadura militar contra
qualquer ofensiva contrária ao regime começa a ser instituída desde a eclosão
do golpe. Em Junho de 1964, foi criado o Serviço Nacional de Informações (SNI),
onde eram catalogados e fichados aqueles que eram considerados inimigos do
Estado, que eram considerados perigosos à Segurança Nacional. O SNI coordenava
e catalogava todas as informações que poderiam ser relevantes: cidadãos e suas
ações eram rastreadas, grampeadas, fotografadas.
Diante da ofensiva estudantil e
guerrilheira a reação da ditadura foi endurecer a repressão, sobretudo durante
os governos dos presidentes Costa e Silva (1967-1969) e Emílio Garrastazu
Médici (1969-1974).
Em 13 de Dezembro de 1968, o
Presidente Costa e Silva decretou, mandou publicar e cumprir o Ato
Institucional Número 5 (o AI-5). Dava-se início aos anos de chumbo.
Pelo disposto no ato, os militares
tinham o direito de decretar o recesso do Congresso, das Assembleias
Legislativas e Câmaras Municipais. Foi retirada toda a estabilidade e
independência do Poder Judiciário, pois o Executivo poderia mandar suspender
habeas-corpus sob a acusação de crime político contra qualquer cidadão em
qualquer momento. A cassação de direitos políticos poderia ser decretada com
extrema rapidez e sem burocracia, o direito de defesa ampla ao acusado foi
eliminado, suspeitos poderiam ter sua prisão decretada imediatamente, sem
necessidade de ordem judicial, os direitos políticos do cidadão comum foram
cancelados e os direitos individuais foram eliminados pela instituição do
desacato à autoridade.
18.
Além do AI-5, outras medidas foram tomadas como:
Criação das Áreas de Segurança
Nacional (1968): municípios brasileiros, inclusive as capitais estaduais, foram
declarados “áreas de segurança nacional”, perdendo sua autonomia e passando a
ter prefeitos nomeados pelo governo federal.
Ato Institucional n° 14 (1969):
determinava a pena de morte ou a prisão perpétua para os crimes da “guerra
revolucionária e subversiva”.
Emenda Constitucional n° 2 (1972):
estabelecia eleições indiretas para os governadores estaduais.
Criação do Colégio Eleitoral (1973):
órgão destinado a eleger o presidente da República.
Foram também ampliados em nível
nacional os aparelhos policiais e militares de repressão, centrados nos
DOI-CODIs. Os CODIs eram os Centros de Operação de Defesa Interna, sendo órgãos
de planejamento das ações de defesa. Os DOIs eram os destacamentos de operações
de informações surgidos a partir de 1970 no Rio de Janeiro, São Paulo, Recife,
Belém, Brasília, etc. Seus destacamentos faziam as investigações, buscavam
informações e realizavam a busca e apreensão. Os DOIs faziam o trabalho sujo:
prisão, interrogatório, tortura e assassinato.
O tenente e torturador Marcelo Paixão
de Belo Horizonte de 1968 a 1971, descreve o método de tortura utilizado:
“A primeira coisa era jogar o sujeito
no meio de uma sala, tirar a roupa dele e começar a gritar para ele entregar o
ponto (lugar marcado para encontros) e os militantes do grupo. Era o primeiro
estágio. Se ele resistisse, tinha um segundo estágio, que era mais porrada. Uma
dava tapa na cara. Outro, soco na boca do estômago. Se não falava, tinha dois
caminhos. Dependia muito de quem aplicava a tortura. Eu gostava muito de
aplicar a palmatória. É muito doloroso, mas faz o sujeito falar. (...) Você
manda o sujeito abrir a mão. O pior é que, de tão desmoralizado, ele abre. Aí
se aplicam dez, quinze bolos na mão dele com força. A mão fica roxa. Ele fala.
A etapa seguinte era o famoso telefone das Forças Armadas. (...) É uma corrente
de baixa amperagem e alta voltagem. (...) Eu gostava muito de ligar nas duas
pontas dos dedos. Pode ligar numa mão e na orelha, mas sempre do mesmo lado do
corpo. O sujeito fica arrasado. O que não pode fazer é deixar a corrente passar
pelo coração. Aí mata. (...) O último estágio em que cheguei foi o pau-de-arara
com choque. Isso era para o queixo-duro, o cara que não abria nas etapas
anteriores.”(Entrevista de Marcelo Paixão de Araújo a Alexandre Oltramari,
revista Veja, 9 de dezembro de 1998. pp. 42-53.)
A ditadura estimulou também a ação de
grupos paramilitares de direita, reunindo civis, policiais e militares, como os
Comandos de Caça aos Comunistas (CCCs) e os Esquadrões da Morte, que realizavam
atentados contra teatros, igrejas, sindicatos, órgãos de imprensa, etc.
No dia 18 de Julho de 1968 integrantes
do Comando de Caça aos Comunistas (CCC) invadem o Teatro Ruth Escobar, em São
Paulo, espancam o elenco da peça Roda Viva.
Em 1969, diversos artistas, como Chico
Buarque de Holanda, Caetano Veloso e Geraldo Vandré sofrem pressões políticas e
são obrigados a deixar o país.
Presos políticos que foram trocados
pelo embaixador americano Charles Elbrick, embarcando para o exterior, em
setembro de 1969
Com a assinatura do AI-5, a censura a
imprensa tornou-se implacavél. O jornal O Estado de São Paulo teve por diversas
vezes seu prédio invadido e suas máquinas para produzir seus jornais paradas
por chefes da Polícia Federal. O Jornal do Brasil teve um de seus diretores
preso, o embaixador José Sette Câmara, ex-governador do estado da Guanabara.
A censura não permitia que nenhum
jornal divulgasse notícias sobre recessão econômica e financeira ou sobre atos
terroristas, preparação de guerrilhas, movimentos operários, greves, explosão
de bombas, assaltos a bancos, roubo de armas, etc.
O jornal semanário de vanguarda O
Pasquim sofreu atentados a bombas e chegou a ter toda a sua redação presa.
Outro semanário, o Opinião teve cerca de 5 mil publicações vetadas pela
censura. Seu diretor, Fernando Gasparian foi detido, e explodiu-se uma bomba em
sua sede.
Uma das ações mais marcantes da
repressão da ditadura foi a morte do jornalista Vladimir Herzog, em 25 de
outubro de 1975. Diretor de jornalismo da TV Cultura de São Paulo, Herzog foi
acusado de pertencer ao PCB. Apresentando-se voluntariamente no DOI-CODI de São
Paulo, foi encontrado morto em uma das celas do órgão, enforcado com seu
próprio cinto. Ninguém acredita na versão oficial de suicídio.
Vladimir Herzog morto. Diretor de
jornalismo da TV Cultura é torturado e assassinado por agentes do DOI-CODI em
São Paulo
“Brasil, ame-o ou deixe-o.” (Famoso slogan da
propaganda oficial do governo Médici, anos 1970.)
O “milagre” econômico brasileiro
Entre os anos de 1968 e 1973, a
economia brasileira apresentou um crescimento extraordinário. Os governos
militares tentaram incrementar no país uma política desenvolvimentista e
modernizadora. Desde 1968, a economia brasileira revigorava-se, vivendo um
ciclo de crescimento inédito na história nacional. No ano de 1969, o crescimento
do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, a soma (em valores monetários) de
todos os bens e serviços finais produzidos numa determinada região, alcançou
10%.
O Brasil tornara-se a décima economia
do mundo, oitava do Ocidente, primeira do hemisfério sul. Esse desempenho foi
liderado pelas atividades industriais. Foi o período do “Milagre Brasileiro”,
do “Brasil Grande”, “Brasil Potência”. O governo festejava o progresso
econômico associando-o ao imaginário do “impávido colosso”, “gigante pela própria
natureza”.
No Brasil, o regime militar,
principalmente durante o governo dos presidentes Médici (1969-1974) e Ernesto
Geisel (1974-1979), optou por ampliar os programas de modernização econômica
para consolidar a base industrial, energética e tecnológica do país.
A expansão econômica do regime militar
atingiu diretamente a região amazônica. Na Amazônia, o início do
desenvolvimento econômico iniciou através de grandes intervenções federais com
a política integracionista e desenvolvimentista do regime militar. A construção
da Transamazônica, a abertura da fronteira agrícola e os grandes projetos
industriais surgiram no período mais repressivo do regime.
Na década de 70, em função dos
objetivos da política econômica e territorial do governo Médici, explicitados
no I Plano no Nacional de Desenvolvimento (PND) para a Amazônia (1972-74), as
políticas para a região amazônica tiveram como finalidade central a integração
física, econômica e cultural da região à economia nacional, a ocupação humana e
o desenvolvimento regional. É neste momento que se verifica a abertura de
grandes rodovias (Belém-Brasília e Transamazônica) e a criação de núcleos
agrícolas que procuravam integrar a região às outras regiões do país e fomentar
o povoamento. No contexto da necessidade da segurança nacional do país, como
diz o slogan do regime, era para “integrar para não entregar”.
O Estado do Pará, pelo seu potencial
energético e mineral, passou a ser foco de atenção. No Pará houve instalação de
Grandes Projetos econômicos voltados para o mercado internacional ou destinados
à produção de insumos para indústrias localizadas em outras regiões do país.
Em termos de realização de Grandes
Projetos, os principais empreendimentos produtivos que se instalaram na região,
foram estes: a construção da rodovia Transamazônica (BR-230); a Usina
Hidrelétrica de Tucuruí (UHT), sobre o rio Tocantins; o da Mineração Rio do
Norte (MRN), de exploração de bauxita metalúrgica, a noroeste do Estado, no
município de Oriximiná; o da Albrás e Alunorte de produção de alumínio e
alumina, respectivamente, localizados nas proximidades de Belém, no município
de Barcarena; o Projeto de Ferro Carajás (PFC), no sudeste do Estado, no
município de Parauapebas.
19.
Mina de Ferro em Carajás, PA.
Desta forma, a Amazônia brasileira se
insere no contexto da ideologia de desenvolvimento regional e segurança
nacional do regime militar. Era um período marcado pelo autoritarismo,
repressão, perseguição policial e militar, supressão de direitos
constitucionais e da liberdade de expressão nos meios de comunicação mediante a
adoção da censura prévia. Porém, contraditoriamente, foi um momento também
marcado por uma euforia desenvolvimentista.
A construção da rodovia Transamazônica
e a implantação de Grandes Projetos industriais e infra estruturais, como a
Usina Hidrelétrica de Tucuruí, tinham de certa forma um estreito
relacionamento; faziam parte da estratégia geopolítica militar para a região.
Isto representou um processo expansionista profundamente idealizado que buscava
atingir o objetivo de ocupar os “espaços vazios” da região amazônica. As
consequências sobre o meio ambiente, a rica biodiversidade regional e seus
recursos naturais, e sobre o homem, em uma região de povos e culturas
diversificadas, eram vistas como parte de um projeto maior.
Apesar de a ditadura ter alcançado
seus objetivos econômicos, isto não significou nenhum projeto de mudança do
regime. Assim como a vitória da seleção brasileira de futebol na copa do mundo
de 1970, o milagre econômico brasileiro foi utilizado para legitimar e
sustentar o próprio regime militar. País, crescimento econômico, futebol, Copa
e seleção brasileira misturavam-se em versinhos patrióticos e propagandas do
regime militar.
O crescimento econômico produziu
modernização e crescimento. A inflação declinou, o nível de emprego cresceu e a
soma das riquezas produzidas no país aumentaram. Mas as desigualdades sociais,
os níveis de pobreza e a radicalização da repressão do regime cresceram em
proporções ainda maiores.
20.
Redemocratização: “lenta e gradual”.
A 15 de março de 1974, tomou posse na
presidência da República o general Ernesto Geisel. O presidente anunciou nos
primeiros dias de seu governo a disposição de promover o “seguro
aperfeiçoamento democrático”, por meio de uma “distensão lenta e gradual”.
Durante o seu governo o AI-5 foi
revogado pela Emenda Constitucional n° 11, em 28 de agosto de 1978, assim como
os demais Atos Institucionais. A censura prévia também foi extinta, mas
continuou a proibição de greves em áreas de “segurança nacional”.
Nesse período, as forças de oposição
contra o regime continuavam a se mobilizar, seja no avanço eleitoral do MDB,
nas grandes greves dos metalúrgicos a partir de 1978 – nas quais se firmou a
liderança de Luís Inácio da Silva, o Lula, presidente do Sindicato dos
Metalúrgicos de São Bernardo –, seja nos movimentos de massa da sociedade
civil, como no caso do Movimento pelos Direitos Humanos e o Movimento pela
Anistia, em 1979.
O general João Batista Figueiredo
sucedeu Geisel na Presidência da República a 15 de março de 1979, garantindo
que conduziria o processo de “abertura política” do regime até a democratização
do país. Sua primeira medida foi a sanção da Lei de Anistia, em agosto de 1979,
que era ampla, geral e irrestrita, ou seja, beneficiava todos os acusados ou
condenados por crimes políticos, entre eles inclusive os agentes do aparelho
repressivo do regime (os torturadores), que ficavam livres de processos
futuros.
A partir de setembro, líderes
políticos exilados começaram a voltar ao Brasil, entre eles os ex-governadores
Leonel Brizola (Rio Grande do Sul) e Miguel Arraes (Pernambuco), o
secretário-geral do PCB, Luís Carlos Prestes, e militantes sindicais e
estudantis.
Ainda em 1979, o Congresso aprovou a
reforma partidária apresentada pelo governo. Com ela, o bipartidarismo foi
extinto. A Arena transformou-se em Partido Democrático Social (PDS),
mantendo-se como partido do governo; o MDB mudou seu nome para Partido do
Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), ao seu lado surgiram outros partidos
de oposição, como o Partido dos Trabalhadores (PT), liderado pelo metalúrgico
Luís Inácio da Silva, o Lula.
A resistência popular à ditadura
diante do desejo pela redemocratização teve seu maior momento na campanha das
Diretas-Já. Nos primeiros meses de 1984, em muitas capitais estaduais, centenas
de milhares de pessoas reuniram-se para pressionar o Congresso Nacional a votar
favorável uma emenda constitucional que restabeleceria o voto direto para
presidente. A mobilização popular foi extraordinária, mas não o suficiente para
ganhar a votação no Congresso. O processo de redemocratização do país viria com
uma conciliação...
Nos últimos trinta anos o
desenvolvimento da Amazônia teve como principal agente indutor o Estado
Nacional que, através de planos e políticas de desenvolvimento, marcou de forma
profunda o cenário econômico, social e político da região.
Além de sua dimensão econômica, a
integração regional passa a ser encarada pelos governos militares com um forte
conteúdo ideológico, consubstanciado na doutrina de segurança nacional: a
Amazônia era encarada como espaço estratégico à unidade nacional e para isso se
fazia necessário o seu controle territorial. Este implicava no fortalecimento
de medidas que, necessárias à ocupação econômica, ganhavam peso e importância
quando associadas a sua compreensão ideológica de ocupação do território como
esquema de segurança.
No entanto, para esta finalidade se
faziam necessárias uma série de reformas no aparelho de Estado.
Na Amazônia é reestruturado todo o
aparato de fomento ao desenvolvimento. É criada a SUDAM, em substituição à
SPVEA, o Banco da Amazônia – BASA, em substituição ao antigo Banco de Crédito
da Amazônia, constituídos de estruturas mais modernas e adequadas à nova fase
que começava a ser gestada. Estruturas estas, sem qualquer representação dos
Estados, Municípios e Territórios da região, diretamente subordinadas à
tecnocracia dos Ministérios e à ação do poder central. Na verdade se pretendia
afastar qualquer influencia do poder local no tocante à tomada de decisões.
Os Grandes Projetos surgem em
sincronia com os planos de “potência emergente” da ditadura e os sonhos
megalomaníacos de no menor espaço de tempo levar o Brasil a tomar parte do
seleto grupo de países desenvolvidos.
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