Comissão Nacional da Verdade é o nome
de uma comissão brasileira que visa investigar violações de direitos humanos
ocorridas entre 1946 e 1988 no Brasil por agentes do estado. Essa comissão será
formada por sete membros nomeados pela presidente do Brasil Dilma Rousseff e
catorze auxiliares, que atuarão durante dois anos, sendo que no final desse
período, publicarão um relatório dos principais achados, que poderá ser público
ou poderá ser enviado apenas para o presidente da república ou o ministro da
defesa. A lei que a institui foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff em
18 de novembro de 2011 e foi instalada oficialmente em 16 de maio de 2012.
A comissão terá o direito de convocar
vítimas ou acusados das violações para depoimentos, ainda que a convocação não
tenha caráter obrigatório e também a ver todos os arquivos do poder público
sobre o período, mas não terá o poder de punir ou recomendar que acusados de
violar direitos humanos sejam punidos. A comissão deverá colaborar com as
instâncias do poder público para a apuração de violação de direitos humanos,
além de enviar aos órgãos públicos competentes dados que possam auxiliar na
identificação de restos mortais de desaparecidos. Também identificará os
locais, estruturas, instituições e circunstâncias relacionadas à prática de
violações de direitos humanos e também eventuais ramificações na sociedade e
nos aparelhos estatais.
A comissão, proposta em 2010, passou
por diversas mudanças, principalmente para atender as queixas dos militares. O
termo "repressão política" foi retirado do texto, a comissão atual
prevê o "exame" de violações de direitos humanos, diferente da versão
de 2010, que previa a "apuração" e além de englobar fatos ocorridos
durante o regime militar no Brasil, que ocorreu ente 1964 e 1985, englobará fatos
que ocorreram entre os anos de 1946 e 1988.
2.
História do regime militar brasileiro
De 1964 a 1988 prevaleceu no país um
regime militar que matou ou "fez desaparecer" ativistas políticos,
sindicalistas e torturou muitos mais. O número de mortos e desaparecidos é
menor em relação a países vizinhos, como a Argentina, também governados por
ditaduras militares. O regime militar brasileiro adotou um sistema rotativo de
presidentes, conservou as eleições, e manteve o Congresso aberto. Entretanto,
as eleições eram fortemente manipuladas, e os militares abertamente ameaçavam o
Congresso, fechado algumas vezes durante esse período, caso este não atendesse
aos interesses do regime. Em 1979 o governo brasileiro promulgou a Lei da
Anistia, que concedia perdão aos exilados políticos e militares envolvidos em
violações aos direitos humanos anteriores a 1979. Devido a esta lei, nenhum
militar ou agente do estado foram julgados e condenados por seus crimes. A
partir de 1985, o regime iniciou, lentamente, a transferência de poder aos
civis, evitando uma transição repentina que poderia instigar revolta popular e
provocar a acusação de líderes militares. Este capítulo do passado brasileiro
criou uma “política do silêncio”, onde atrocidades e décadas da história do
Brasil são varridas para debaixo do tapete.
Em 1986, a Arquidiocese de São Paulo
encabeçada pelo Arcebispo Paulo Evaristo Arns publicou um livro chamado Brasil:
Nunca Mais, sobre o disseminado uso da tortura durante o regime militar. De
1979 a 1982, enquanto os militares ainda estavam no poder, advogados e outros
pesquisadores buscaram investigar em que medida o regime usou a tortura como
forma de punição a seus inimigos políticos, secretamente copiando registros de
julgamentos militares entre 1964 e 1979, e ouvindo testemunhos de presos
políticos. A publicação e lançamento da obra foram adiados até março de 1985
para assegurar que um governo democrático e um presidente civil estivessem no
poder. O relatório concluiu que os militares usaram de tortura no seu sistema
judiciário, e que as autoridades de tal sistema sabiam que esses métodos de
tortura eram utilizados para extrair confissões. As recomendações para o Brasil
eram vagas, sugeriu que os brasileiros garantissem "que a violência, a
infâmia, a injustiça, e a perseguição ao passado recente do Brasil não se
repetissem", e que os cidadãos participassem da política para assegurar
que o governo mantivesse transparência em suas ações. Este relato, entretanto,
falhou em causar grandes mudanças no país devido à Lei de Anistia, que protegia
os infratores dos direitos humanos entre 1964 e 1985, e também por causa da
falta de apoio governamental para legitimar as mudanças.
3.
Formação da comissão
Nomeados
No dia 10 de maio de 2012, foi
anunciada pela presidente Dilma Rousseff, a lista de sete pessoas que integram
a comissão.
• Cláudio
Fonteles: Procurador-geral da República entre os anos de 2003 e 2005. Foi
membro da Ação Popular, que comandou a União Nacional dos Estudantes na década
de 1960;
• Gilson
Dipp: Ministro do Superior Tribunal de Justiça e membro do Tribunal Superior
Eleitoral desde 2011;
• José
Carlos Dias: Ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso;
• José
Paulo Cavalcante Filho: Advogado, consultor e escritor;
• Maria
Rita Kehl: Psicanalista, cronista e crítica literária;
• Paulo
Sérgio Pinheiro: Diplomata e Sociólogo da Universidade de São Paulo;
• Rosa
Maria Cardoso da Cunha: Advogada criminalista, professora e escritora.
4.
Pedido de desnomeação
O Comitê Paulista Memória Verdade e
Justiça protocolou no Gabinete Regional da Presidência da República, em 25 de
maio de 2012, um pedido de desnomeação de Gilson Dipp da Comissão da Verdade,
pois ele atuou como perito na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em
nome do Estado brasileiro, contra os familiares dos guerrilheiros do Araguaia,
o que o tornaria sem isenção para participar das investigações, de acordo com
os próprios moldes da lei que criou a Comissão.
Posteriormente, se esclareceu que os
peritos não opinam sobre o mérito dos julgamentos. Gilson Dipp foi chamado para
testemunhar somente sobre o mecanismo "Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental", ou ADPF, em função da ADPF 153 interposta pela
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A sentença de 24 de novembro de 2010
explica claramente este fato, em sua página 24: "Gilson Langaro Dipp,
Ministro do Superior Tribunal de Justiça, ex-Corregedor Nacional de Justiça,
perito proposto pelo Estado. Apresentou perícia sobre a Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental, à luz do ordenamento jurídico
brasileiro.
5.
Críticas
As críticas são variadas. Ativistas
defensores da investigação das violações dos direitos humanos alegam que a
comissão, sem o direito de punir, não colaborará para que se faça justiça.
Alguns militares e policiais queixam-se de não terem representantes e temem que
a comissão não dê o devido peso a crimes cometidos por organizações de
esquerda, afirmam que a comissão pode "reabrir feridas" na sociedade
brasileira e "dividir os brasileiros" e dizem que essa comissão trará
à tona "sequelas deixadas por ambos os lados". Alguns analistas dizem
que dois anos é um tempo muito curto e o número de integrantes é baixo e por
isso não concluirão de modo satisfatório as investigações.
Há também críticas sobre a
parcialidade da comissão e que essa comissão não leva em conta o contexto da
época do regime militar e que a comissão, do jeito que está organizada, é
revanchista, insultuosa e agressiva contra as Forças Armadas.
Com a preocupação de blindar militares
futuramente convidados a depor na Comissão Nacional da Verdade e visando
apresentar um contraponto a possíveis críticas às Forças Armadas, Ricardo Veiga
Cabral, presidente do Clube Naval, criou uma "comissão paralela da
verdade" e montou um grupo jurídico para assessorá-la.
Para Luiza Erundina, a comissão foi
criada muito apressadamente, sem nenhuma discussão por especialistas, sem
audiências públicas e sem possibilidades de emendas. Além disso, diz que a
comissão não terá autonomia orçamentária para realizar viagens e é dependente
da Casa Civil e que, por causa disso, os membros não poderão ir atrás de fontes
para ajudar a esclarecer as violações de direitos humanos.
6.
Criação de comissão paralela
Por causa da composição da Comissão da
Verdade, um grupo de oficiais reformados das Forças Armadas criou no dia 26 de
maio de 2012, uma comissão paralela, denominada Comissão Paralela da Verdade,
cujo objetivo é rebater as acusações da comissão oficial que não considerem
verdadeiras. Segundo Ricardo Antônio da Veiga Cabral, presidente do Clube Naval
do Rio de Janeiro e também da comissão paralela, o clube designou sete oficiais
para fazer parte dessa comissão e disse também que a comissão paralela não
produzirá um relatório próprio, apenas irá rebater as acusações. Essa comissão
prestará assessoria jurídica aos militares que prestarão depoimento na comissão
oficial.
Comissão da Verdade restringe
investigação a agentes públicos
Foi publicada no dia 17/09/2012, no
Diário Oficial da União resolução da Comissão Nacional da Verdade (CVN), que
restringe as investigações do grupo a agentes públicos ou a serviço do Estado.
Com isso, ficam excluídas apurações sobre crimes cometidos por opositores do
regime militar durante a ditadura.
Segundo a assessoria de imprensa do
colegiado, a decisão segue entendimento, já previsto em leis anteriores e em
acordos internacionais, de que violações aos direitos humanos são somente
praticadas pelo Estado. Com isso, atentados e roubos a bancos, por exemplo,
cometidos por grupos armados de esquerda, ficarão de fora das apurações.
No fim da tarde do dia 17/09/2012, o
ex-procurador da República Cláudio Fonteles, um dos integrantes da comissão,
disse que a decisão ajuda a "clarear" a missão do grupo e justificou
a restrição. "Setores da esquerda armada já forma investigados e
punidos", afirmou.
O alvo das investigações foi objeto de
polêmica durante a elaboração da lei no Executivo e na discussão no
Legislativo. Antes mesmo de o projeto de lei que criava a Comissão da Verdade
ser enviado ao Congresso, em 2010, o texto foi alterado para retirar a
expressão "repressão política" da parte que falava sobre o contexto
do que seria investigado.
A mudança, feita sob pressão de
setores militares, visava deixar em aberto o foco das apurações, na expectativa
de incluir também delitos cometidos por grupos de guerrilha. Outra exigência
foi a de que a comissão se limitasse a examinar os fatos, sem propor ou levar a
condenações de envolvidos, o que foi atendido em respeito à Lei da Anistia
(1979), que perdoou os crimes políticos cometidos à época.
Ainda sobre a restrição, Fonteles
afirmou que não teme eventuais críticas por parte dos militares. "Se tiver
[críticas] é a democracia, justamente. As críticas nós temos de recebê-las e
com aqueles que nos criticam dialogarem, e mostrar as boas razões pelas quais
nós estamos cumprindo esta missão”.
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